sexta-feira, 30 de abril de 2010

Le Nozze di Figaro

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Archivo photographico

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Os condes de Arnoso

quinta-feira, 29 de abril de 2010

Vox populi

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As cadelas apressadas têm os filhos cegos.

Yesterday night

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quarta-feira, 28 de abril de 2010

Marlborough

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Ai, a saudade

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Esta palavra saudade
aquele que a inventou
a primeira vez que a disse
com certeza que chorou.

Afonso Lopes Vieira

terça-feira, 27 de abril de 2010

Cister

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L'Artiste

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Atravessou o país inteiro, viu-o ser reino, república e império. Dos franceses recebeu a melhor das prendas, aplausos, risos, gargalhadas. A voz e elegância em palco notabilizaram-no, perpetuando o seu nome na história da ópera, do teatro, da música e da comédia.
Bendito o dia em que abandonou a casa onde nascera, renegando a vontade do pai para que, seguindo-lhe os passos, se tornasse cirurgião. Bendita a hora em que, chegado a Paris, abraçou fortemente o seu sonho e mergulhou no mundo do espectáculo. Benditos todos os momentos em que da sua pena brotaram peças e libretos, em que do seu timbre e gestos se soltaram da mais tímida à mais atrevida risada do público.
Reformou-se depois de Napoleão se recusar a aumentar-lhe o seu já elevado salário. Viria a morrer no dia 5 de Maio, vinte e um anos depois do Imperador francês. Eis François Elleviou.

segunda-feira, 26 de abril de 2010

Back

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O dia seguinte

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Tinha uma mercearia, na Baixa, entalada entre um sapateiro e uma loja de modas.

O lucro modesto dava-lhe alento para emperiquitar o estabelecimento e trazer às clientes uma ou outra novidade. O rebuçado colorido de sabores exóticos, o tira-nódoas milagroso ou o bálsamo da juventude.

Alice não lhe largava a casa. Aviava-se todos os dias, antes de subir ao seu terceiro andar nos Fanqueiros, vinda do ministério onde secretariava o dia inteiro. O fiambre, o grão, o leite ou o sabão davam-lhe o mote para dois dedos de conversa e uns tostões deixados na loja.

Ontem mesmo, vira desfilar na calçada cravos vermelhos. Depois, ouvira dizer que o regime mudara. Hoje, ouvia logo da soleira da porta os lamentos da cliente, esfalfada pela balbúrdia da liberdade. A ela ninguém podia apontar o dedo. Mas vira coisas, lá isso vira, a queima de papéis, gavetas revolvidas, gente corrida a pontapé das repartições. Temia pelo emprego, pelo sustento, e não via o caso com bons olhos.

Já ele, o da venda, sacudia os ombros com desprezo. Assim ou assado, tinham todos de comer. Não se lhe fraquejava o negócio só porque os cabeçalhos dos papéis do governo mudavam. O diabo era a Matilde, a velha avarenta, que lhe levara um bacalhau fiado quarta-feira e na sexta ainda não o pagara.

Os hábitos não se mudavam de um dia para o outro. Quanto ao resto, sempre fora assim. Rei morto, rei posto.

domingo, 25 de abril de 2010

Le Grand Tour

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sábado, 24 de abril de 2010

Agora é que são elas

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Marie Antoinette
Vigée Le Brun

sexta-feira, 23 de abril de 2010

Quem te viu...

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e quem te vê.

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quinta-feira, 22 de abril de 2010

Five o'clock

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Com o chá quente diante de si, a cabeça fumegava-lhe de ideias.

À la Malmaison

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quarta-feira, 21 de abril de 2010

Nascida do pó

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Na aridez do planalto central brasileiro nascia uma cidade nova, fruto dos sonhos de muitos e da vontade de um só.

Vivia-se então, pelos anos 50, uma era de prosperidade no Brasil. Caminhava, acreditava-se, para um futuro dourado, de nação forte e pioneira, rumo a um destino glorioso e vasto, tão vasto como a fatia do hemisfério por onde se estendiam os domínios de Vera Cruz.

Este foi, aliás, um dos nomes propostos para o baptismo da capital, a nova, planeada desde Pombal, no desejo grandioso de povoar um quase continente e levar ao interior, ao sertão árido e mudo, as gentes que se amontoavam nas colinas de Salvador e do Rio.

Com a independência, gritada no Ipiranga, a ideia ganhou força mas não foi longe. Era cómoda a cidade maravilhosa, que já vira reis e imperadores, banhada pela Guanabara, de clima mais risonho e luminoso.

Uma capital nova, mais além de Minas Gerais e Goiás, onde até poucos se tinham aventurado, tornou-se até coisa de lei. As Constituição deixava delimitado um pedaço da terra prometida.

Enfim, no entusiasmo do progresso, uma cidade ergue-se na terra vermelha, soprada do pó como as bíblicas personagens, abrindo as suas asas diante de um oásis azul, na gesto simples de uma cruz, de um assinalar de local, de uma ave que paira e abençoa a obra criadora. O primeiro fôlego deu-lhe Juscelino Kubitschek, depois moldou-a Lúcio Costa. Niemeyer deu-lhe corpo, o povo deu-lhe alma.

Fria, admirável ou incompreensível, de arquitectura fantástica ou repugnante, feita para a escala de gigantes que nunca a habitaram ou com as dimensões ideais, assim variam as vozes que dela comentam, sem a sentirem bem, por não terem lá raízes as gerações que primeiro a ocuparam.

Se os habitantes passam se lhe deixar marca, a obra permanece. Questione-se-lhe ou não o gosto, a virtude, a estética ou a razão de ser, a verdade é que a Brasília utópica de muitos séculos se tornou real pela vontade e pelo pulso dos homens. Mas não foram só os que as letras de bronze inscrevem na pedra dos memoriais. Foram aqueles que anónimos, indiferentes à obra que faziam, a erigiam mais pela necessidade de sobreviver que de criar.

Brasília. O sonho que persistiu, sem se desvanecer sob calor sufocante, deu razão a quem a quis, pensou e fez. Foi há cinquenta anos.

Long live the Queen

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terça-feira, 20 de abril de 2010

They are family

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A família mais famosa dos Estados Unidos e arredores nasceu de uma curta-metragem no The Tracy Ullman Show. Mais célebre até, arriscaria a dizer, que qualquer clã presidencial que ocupe a Casa Branca. Com domicílio fixo em Evergreen Terrace, numa Springfield de um dos estados norte-americanos, há anos que animam os serões de miúdos e graúdos.

Ousados, idiotas e, acima de tudo, bem-humorados, os membros da família formam um grupo mais do que heterogéneo. Apesar das contrariedades, dos acidentes e das peripécias impossíveis, existe uma forte ligação entre todos que garante a sustentabilidade da prole de Homer e Marge.

Caracteristicamente amarelos, cabelos irreverentes ou falta deles, olhos grandes e sorrisos largos, os Simpsons são inconfundíveis. O sucesso, todavia, foi tão inesperado quanto repentino. As primeiras aparições aconteceram no programa de Tracey, à laia de sketch bem-disposto. Foi paixão à primeira vista. Dos cinco minutos de fama rapidamente passaram ao episódio de meia hora. E as temporadas sucederam-se uma após outra, numa quase inesgotável criatividade de argumentos e personagens.

Razões para o sucesso? O humor, do naïf ao mórbido, a crítica aos costumes e ao conservadorismo exagerado ou ao cego fanatismo e, talvez a mais forte, as semelhanças entre ficção e realidade. O chefe de família preguiçoso e despreocupado, a dona de casa omnipresente, a rapariga ajuizada e inteligente, o enfant terrible, traquina e irresponsável e a bebé astuta, possuem traços que facilmente se apontam aos que se cruzam connosco.

O patrão avarento, o vizinho idiota, os desenhos animados violentos, a cerveja e os amigos aproximam-se igualmente do quotidiano, tão comuns que ultrapassam as fronteiras e deixam que mesmo na Europa se reconheçam nas personagens muitos traços dos esplendores e das misérias quotidianas.

Quase sem dar por isso, tornaram-se um caso sério de longevidade. Contas feitas, já lá vão mais de vinte anos. Surpreendente? Bart teria a exclamação ideal. ¡Ay, caramba!

Second Empire

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Napoléon III
Winterhalter

segunda-feira, 19 de abril de 2010

O homem e o betão

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O campus do Instituto Superior Técnico, a fonte monumental da Alameda, a auto-estrada que de Lisboa não chegava ao Porto ou a mancha verde de Monsanto. Tudo isto se deve, de uma forma ou de outra, a Duarte Pacheco.

Por aquele tempo, o regime sonhava com uma Lisboa que, na sua grandiosidade austera, se impusesse com a dignidade de capital do Império. Em 40, expôs-se o mundo português aos mundos, abriu-se a Portela ao pouso de aviões e empertigou-se a cidade, numa pompa joanina desfasada das inovações que então se buscavam.

Lisboa, lugar obrigatório de realizações públicas, acabara por ombrear com o próprio Ministério, sob os desígnios do Engenheiro. Mesmo que considerasse o regime fechado, havia que o abrir à cultura e ao progresso, e deixar transparecer para além da velha Lusitânia, a imagem de um Estado que, mesmo em tempos de guerra, se mostrava pacífico na sua obra.

A ponte que hoje se discute, entre uma banda e outra, já ele a mandara estudar, no desejo de estender, a partir da capital, uma rede de comunicações que se espelhava também nas reformas dos correios e dos telefones. A via rápida ficou-se por Vila Franca, mas teve o mérito de ser pioneira. A marginal, que serpenteia ao sol pela beira do Tejo, não teve menos utilidade. Do punho de Duarte vieram projectos, planos e despachos, sementes insignificantes de onde brotavam depois os monumentos que impressionavam, por inéditos, inovadores ou grandiosos.

A ironia, que prefere dar ares de sua graça mais na tragédia que na felicidade, marcou presença no final da vida do professor e estadista. Ele que imaginara uma rede de vias de comunicação, veio a falecer num acidente automóvel, vinco do sul. Mau grado seu, não possuía a robustez do betão que lhe sustentava as obras. Sucumbiu aos quarenta e quatro anos.

A memória de quem foi permanece, no Viaduto e por toda a cidade, onde rasgos de imponência e perspectivas monumentais, traçadas para engrandecer a vastidão do Império, relembram a visão ampla do Homem.

Chez le roi

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domingo, 18 de abril de 2010

Le Grand Tour

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sábado, 17 de abril de 2010

Agora é que são elas

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Isabel de Portugal
Tiziano

sexta-feira, 16 de abril de 2010

Splendour

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quinta-feira, 15 de abril de 2010

Do engenho e da arte

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Uma máquina de voar. Até ao século XX, nada mais que uma utopia.  Era coisa de ave, isso de planar no céu azul e esvoaçar entre rochedos escarpados no topo das montanhas. Um sonho, nada mais.

Alguns, temerários, quiseram desafiar a física e, não era pouca gente a dizê-lo, o próprio Deus. Os destemidos mergulhavam no abismo, num voo certo e fatídico, diante de multidões ávidas, como o alfaiate que, lançando-se da Torre Eiffel, acreditava nas asas de pano que vestira. Ao menos, a Passarola de Gusmão ou o balão dos Montgolfier haviam tido melhor sorte.

Antes dele, um outro homem sonhara mais alto e construíra, no ar e no papel, castelos bem mais sólidos. Nascera em Vinci, a 15 de Abril do remoto ano de 1452 e fora baptizado com o nome de Leonardo. Quase sete décadas depois, quando a morte o levou, possuía um legado fascinante. Homem de mil ofícios, mente rara onde conviviam em perfeita harmonia as ciências, as artes e as letras, personificou como nenhum outro o ideal renascentista.

Os esboços das máquinas de voar, que hoje se dizem perfeitamente exequíveis, os estudos anatómicos, a Última Ceia, a enigmática senhora do sorriso, o Homem de Vitrúvio, os poemas, a escrita invertida, mil e uma coisas que, séculos volvidos, mantêm a mesma vitalidade e alimentam intermináveis polémicas. Discute-se-lhe a inteligência, os engenhos, a sexualidade, os significados ocultos de cada obra-prima, mas sem questionar nunca o valor inestimável do ser humano.

Louva-se-lhe a multiplicidade de interesses, a capacidade de alargar os horizontes a todo o conhecimento. Agora, prefere-se a especialização, estudada até ao mais ínfimo pormenor. Não teria Da Vinci uma visão mais acertada de, afinal, tudo o que nos rodeia? Não seria ele um homem bem mais completo e em larga comunhão com a natureza, alimentando-se do prazer e da estética que a arte e o saber lhe traziam?

Canta a Pedra Filosofal que o sonho comanda a vida e, escreve Pessoa, o homem sonha e a obra nasce. Leonardo não voou, mas sonhou. E deu o passo essencial para a criação. Mais do que a obra e o génio, admire-se o homem. O homem que, cinco séculos depois de ter finalmente alcançado os céus, continua a mostrar-se como um admirável exemplo. Nem que seja, já o dizia Gedeão, pelo sonho, essa constante da vida, tão concreta e definida como outra coisa qualquer.

Lá fora

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quarta-feira, 14 de abril de 2010

Um novo século

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1900. O presidente Émile Loubet inaugura com solenidade a Exposição Universal de Paris.

A cidade cintilava com esperança no novo século. O desenvolvimento cultural, os avanços científicos, as revoluções da indústria, os cânones de gosto, o melhor de cada Estado, exibia-se com orgulho nos vastos pavilhões aglomerados em redor da Torre que, apesar das adversidades, se mantinha desde 1889 de pedra e cal, ou melhor, de ferro e aço.

Dos quatro cantos do globo, se os tivesse, chegavam milhões de visitantes assombrados com as maravilhas da electricidade, com os filmes sonoros e as escadas rolantes. Acreditava-se no progresso com a mesma força que se atribui a uma divindade superior e omnipotente. Não interessava bem como nem porquê. O fantástico era percorrer um pedaço de Paris, engalanada para a exibição e desfrutar da obra e das coisas tecidas pela mão humana.

Paris aprumou-se a rigor para a solenidade. Construíram-se gares, lançaram-se pontes, abriu-se a primeira linha de metropolitano. O Grand Palais testemunha, se bem que tenuemente, a monumentalidade das construções fundindo-se com a cidade na sua transparência de ferro e vidro.

Sem adivinhar a Guerra que havia de chegar depois, vivia-se com animação e confiança o tempo de paz e prosperidade. De resto, quem não se assombrava com inventos capazes de coisas que antes não se diriam possíveis? Já o conselheiro Pinto Porto, na Civilização de Eça, confidenciava ao fonógrafo o respeito pelas proezas daquela época.

«Maravilhosa invenção! Quem não admirará os progressos deste século?»

terça-feira, 13 de abril de 2010

Promenade

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segunda-feira, 12 de abril de 2010

Humor de perdição

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Goste-se ou não, Herman José é uma referência do humor em Portugal. Ousado, inovador e provocante, se as mentalidades lusitanas mudaram ao longo das últimas décadas, um pedaço dessa transformação, por ínfimo que seja, dever-se-á a ele. Cada sketch, cada irreverência, cada golpe desferido num conservadorismo mais de fachada que de alma derrubava tabus ou esbatia pudores.

As caricaturas, da tia Pureza à Maximiliana, mostraram as fraquezas, os tiques e as pequenas misérias quotidianas que se querem esconder debaixo do tapete. Fez sucesso. Os pitorescos Nelo e Idália, com resmas de ignorância trapalhona na conveniência flagrante de um casamento de faz-de-conta ou os respeitáveis convidados do Boião de cultura, numa versão menos narrável da história portuguesa, fizeram o país rir de si mesmo.

A roda da sorte girou. Com a Última Ceia a polémica estalou, impondo-lhe um exílio temporário, longe da ribalta. Irreverências empurraram-no para um percurso nómada, em busca do tal canal.

A erosão do tempo fez-se sentir, mais tarde ou mais cedo. Novos talentos, novos formatos, novas formas de cravar ferroadas na mesquinhez que não raras vezes ainda persiste, desgastaram o humorista mas não lhe roubaram o mérito. HermanSic arrastou-se anos, num horário de domingo tardio, vazio de graças e conteúdos. O programa terminou na hora H. O declínio era evidente. Com mais do mesmo, em outros horários, forçou-se uma reabilitação, nem sempre com os melhores resultados.

Agora, anuncia-se novo regresso de Herman, desta feita na RTP. Estará ele de parabéns por voltar ao ecrã ou corre o risco de o seu humor o levar à perdição? Diz o povo, naquela sabedoria frequentemente duvidosa, que é melhor cair em graça do que ser engraçado. A ver vamos.

domingo, 11 de abril de 2010

Le Grand Tour

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sábado, 10 de abril de 2010

Agora é que são elas

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Eugénie de Montijo
Winterhalter

sexta-feira, 9 de abril de 2010

De manhã

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quinta-feira, 8 de abril de 2010

Cidade etérea

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Um autocarro vermelho de dois andares, perdido no mar de trânsito, com o Big Ben ao fundo. É Londres, claro.

Quase não se sabe é que em Lisboa também circularam autocarros semelhantes às célebres viaturas londrinas. Pois é. Verdinhos, com dois pisos, eles faziam várias carreiras pela cidade. Haverá pouca gente a recordar-se deles. Não tanto pelo tempo em que deixaram de servir mas mais por aquela renovação constante que se faz da memória.

Diluem-se, diante da imagem do presente, as lembranças do quotidiano gradualmente transformado, com tantos vagares que as mudanças, longe de serem súbitas, apenas se percebem em certas comparações que revolvem a infância quase esquecida ou a adolescência irreverente e nostálgica.

A cidade perde-se no correr do dia-a-dia. A de hoje está longe de se assemelhar à da década de 60 ou 70. Onde estão os autocarros verdes? Os velhos torniquetes do metropolitano, as paredes sujas onde se pintavam propagandas da Revolução ou o vasto estacionamento do Terreiro do Paço? Para melhor ou pior, o certo é que a cidade mudou.

A fotografia é dessa metamorfose apenas um testemunho ténue. Se a uns serve de alavanca, pondo a rolar a engrenagem da imaginação, da tentativa vã de reconstituir uma época que não se viveu, para outros é um interruptor que acende as lembranças que a pouco e pouco se foram empurrando para um canto escuro da memória.

A urbe, como alguém que envelhece, transforma-se em tornos dos traços fixos que lhe dão carácter. A fisionomia, reconhecível, vai sofrendo os ajustes que o tempo lhe confere. De São Pedro de Alcântara hão-de avistar-se as sete colinas da tradição, o castelo, sereno e dominador, no alto do seu monte, as ameias da Sé esticando-se por entre o casario e as ruelas tortuosas de Alfama, o risco azul do Tejo rematado no horizonte pela Arrábida. Mas em baixo, no formigueiro de gente e no amontoado de telhados que se espraia como um lençol ondulado, mudam-se gentes e fachadas.

Uma Lisboa de anos longínquos existe apenas dentro de cada um que a conheceu. Por isso, hoje, observemos todos os nadas que lhe dão essência e vida e que lhe escrevem a história, e perpetuemos uma imagem que em breve se desmaterializará. E um dia, ainda distante, quando recuperarmos a lembrança vaga e enevoada da cidade de hoje, perceberemos que, na subtileza da mudança, quase incompreensível, passou uma vida inteira.

quarta-feira, 7 de abril de 2010

tarde de Graça

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terça-feira, 6 de abril de 2010

O exilado

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6 de Abril de 1814. Em Fontainebleau, umas das residências que lhe era mais querida, assina uma abdicação. Mas diz-se que as esperanças morrem por último e ele depositou-as em seu filho, criança ainda, que fizera Rei de Roma.

Reinado efémero, pouco menos de uma semana até nova e definitiva abdicação. Sem imposições. Cai assim, num fim abrupto, um império construído a ferro e fogo, que a neve russa começou a minar, num prenúncio dos últimos dias. Um simples papel e uma pena bastaram para encerrar um capítulo, um vasto capítulo, na história da Europa.

O império não renasceu. Mas as esperanças, essas, não tinham sucumbido ainda. Mesmo em Elba, a proximidade ao continente aguçava-lhe o apetite e o desejo de posse, de reconquista, de ir, de ver e de vencer, mais uma vez. Foi, de facto. Mas não ficou mais do que cem dias, cem dias que lhe mataram definitivamente a fé.

Santa Helena calmou-lhe a impaciência de um retorno e tornou-lhe árida a sede de poder. Quando morreu, quase esquecido, numa amargura solitária do desterro, era apenas um homem comum. O apelido era Bonaparte. O nome, Napoleão.

segunda-feira, 5 de abril de 2010

Curia regis

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domingo, 4 de abril de 2010

Le Grand Tour

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sábado, 3 de abril de 2010

Um mais um

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O amor acontece. Mesmo que se compreenda, dificilmente se explica. Eterno ou efémero, correspondido ou não, apaixonante ou idílico, mais a uns que a outros.

Talvez não exista sequer como o imaginamos. Confundem-se nele a amizade, o carinho, até o ódio, sem deixar perceber bem fronteiras definidas. Simplesmente emoções.

Gente há com o mérito de fazer o amor perdurar bem mais do que se imagina. No jardim, nas áleas douradas pelo sol, caminham às vezes, com a quietude e a segurança que só as longas décadas de vida lhes dão, parzinhos românticos, de rostos vincados pelo tempo, onde o amor se foi metamorfoseando em tolerância, em compreensão, num comodismo recatado das coisas do coração. Amam-se sem ter a necessidade de o dizer. Apenas porque o sentem.

Haverá um segredo para estes amores tão fortes? Um matemático castelhano veio dizer que sim. Servindo-se da teoria matemática do controlo optimal, o tal investigador chegou a uma conclusão deliciosamente brilhante. É necessário um investimento contínuo para compensar o desgaste natural do amor.

Uma daquelas ideias inéditas. Ninguém diria que somos gente de carne e osso, que a nossa personalidade se molda vida fora e que nem sempre nos relacionamos do mesmo modo com os outros. Ame-se ou não, a forma de o fazer também se altera com tudo isto tornando necessária uma adaptação constante.

Matemáticas fora, ficam os sentimentos. Esses sim incertos, oscilantes, imperfeitos, mas tão naturais quanto humanos. Um mais um serão sempre dois, mas a soma nem sempre resulta de forma igual. O tempo encarrega-se de tirar a prova dos nove. De resto, costuma o povo dizer, quando um não quer, dois não fazem.

Agora é que são elas

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D. Maria Amélia de Bragança
Joseph Karl Stieler

sexta-feira, 2 de abril de 2010

Imperial Easter

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quinta-feira, 1 de abril de 2010

Monarquia de Abril

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As bandeiras azuis e brancas hasteadas em diversos pontos do país serviram de alerta. Foi restaurada a Monarquia em Portugal.

Pelas 7h da manhã o Palácio de Belém começou a ser bombardeado a partir de um cruzador ao largo do Tejo. Ao mesmo tempo, enquanto a rádio transmitia o Hino da Carta, diversas forças militares concentraram-se na Praça Marquês de Pombal, condicionando fortemente o trânsito e provocando o caos à entrada de Lisboa.

São Bento rendeu-se sem dificuldade, não havendo resistência por parte dos partidos políticos com assento parlamentar. Ao início da tarde, o Presidente da República deixou Belém e procurou refúgio na travessa do Possolo, vendo-se depois obrigado a rumar para sul, onde deixou o país numa embarcação ancorada perto de Boliqueime.

No largo do Município, sob as buzinas dos automobilistas incomodados com as obras no Terreiro do Paço, um conjunto de notáveis proclamou a Monarquia, restaurada na pessoa de D. Duarte II. Rosario Poidimani já fez saber que vai agir judicialmente contra o Estado Português e o Duque de Loulé abandonou imediatamente o país.

Quando tentava sair do território, no congestionado aeroporto da Portela, um membro do governo deposto teve ainda tempo de, questionado acerca dos malefícios da mudança de regime, responder que para pior não se pode ir e que é necessário manter a confiança e o optimismo.

Aguardam-se com expectativa as reacções internacionais e a aceitação do novo Reino de Portugal.

O Principado da Fuzeta já informou que reconhece o actual monarca português e aproveitou para se proclamar independente. São más notícias para o turismo. Este verão, o Algarve vai estar mais pequeno.